Posted in NOTÍCIAS JURÍDICAS | 0 comments

STJ

“A questão consiste em saber se o desvio de clientela realizado no curso da relação de trabalho configura concorrência desleal, assim como se há limitação da conduta quanto ao período do contrato de trabalho.

No caso, trata-se de ação indenizatória, ajuizada por ex-empregadoras contra ex-empregados e concorrente, por concorrência desleal fundada em desvio de clientela.

A busca por clientela é o objetivo de todo empresário. Conquistar clientes significa, de certo modo, “desviar” clientes de outrem. Nesse contexto, é possível, dentro do campo da licitude, que o agente econômico cause danos justos (mesmo que extensos) aos concorrentes.

A distinção entre a licitude e a ilicitude está, portanto, na forma como a conquista de clientes é feita. Se a concorrência se dá a partir de atos de eficiência próprios ou de ineficiência alheia, esse ato tende a ser leal. Por outro lado, se a concorrência é estabelecida a partir de atos injustos, em muito se aproximando da lógica do abuso de direito, é que se pode falar em concorrência desleal.

Trata-se, portanto, de escolha do contratante que pode decorrer de sua anterior experiência com aquele produto, da indicação de utilização por outrem, do marketing realizado pelo empresário, do prestígio da marca, da qualidade do serviço, da solidez do nome empresarial – situações que envolvem o esforço do empresário.

Para a análise dos limites que norteiam a concorrência lícita, há que se considerar, ainda, as hipóteses de vedação contratual de concorrência, a exemplo das cláusulas de não concorrência e confidencialidade, não restabelecimento ou restritivas de concorrência contidas em contratos de trabalho, trespasse e locação de espaço comercial.

Especificamente acerca do dever de fidelidade, entende-se que este é inerente ao contrato de trabalho no exercício de sua vigência, com previsão inclusive no art. 482, c, da Consolidação das Leis do Trabalho. A boa-fé no desenvolvimento do trabalho consiste em elemento basilar da relação jurídica entabulada. Encerrado o contrato de trabalho, contudo, eventual condição de não concorrência, caso não previamente pactuada, não mais constitui obrigação a ser observada.

Não se desconsidera, contudo, o dever de sigilo quanto às questões confidenciais, as quais estão resguardadas tanto na Lei de Propriedade Industrial como na Lei Geral de Proteção de Dados (artigos 46 a 49). Cumpre registrar que o sigilo não engloba todo conhecimento e informação obtida pelo empregado em sua atividade, porquanto, em seu exercício, ele também desenvolve know-how próprio decorrente da especialidade e anos de experiência.

Diante disso, o direcionamento de clientes para a empresa concorrente realizado por empregado no curso da relação de trabalho configura desvio ilícito de clientela, o que se traduz em ato de concorrência desleal, baseado no aproveitamento da condição de representante do empregador no exercício da atividade negocial, conduta que se enquadra no disposto no artigo 195, III, da Lei n. 9.279/1996.

No caso, o desvio de clientela perpetrado no exercício do contrato de trabalho dos ex-empregados com a então empregadora preenche os elementos constitutivos do desvio ilícito de clientela. No entanto, em relação ao período que se segue, para que tais condições estejam evidenciadas, faz-se necessária a presença de alguma das hipóteses restritivas da concorrência lícita.

Quanto ao ponto, conforme consignado pelo magistrado de origem: “No caso, ausente cláusula contratual expressamente dispondo que os funcionários da parte autora, após o término do contrato de trabalho, estariam proibidos de atuar no setor, com previsão de cláusulas com condições resolutiva, suspensiva ou com sanções em caso de descumprimento contratual, não há que se falar em restrição ao exercício da livre concorrência e da atividade naquele mercado pelos requeridos, o que poderia ser considerado indevido cerceamento ao exercício da livre iniciativa e do exercício de atividade profissional. (..) Ressalto, também, que a atuação no ramo indicado não envolve técnica inovadora ou direito patenteado capaz de justificar a abstenção de seus ex-empregados de se valerem de seus conhecimentos técnicos (expertise) na cadeia produtiva de outra empresa, inserindo-se como patrimônio intelectual lícito. Por óbvio, o conhecimento em vendas detido pelos réus também não se qualifica como segredo de indústria”.

Assim, verifica-se que, em razão da ausência de impedimento legal ou contratual do exercício da atividade pelos ex-empregados em favor da empresa concorrente após sua despedida das ex-empregadoras, não estão preenchidos os elementos configuradores da concorrência desleal, razão pela qual os danos a serem reparados se limitam àqueles gerados até a data do encerramento dos contratos de trabalho.”

Fonte: STJ (Informativo de Jurisprudência)

(13/05/2025)