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Privacidade 2

É constitucional o compartilhamento de dados da Receita e da Unidade de Inteligência Financeira (UIF), antigo Coaf, com o MP para fins de persecução penal, sem a necessidade de autorização judicial, devendo a troca de informações ser feita por meio de comunicações formais. Assim decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira (4/12), na definição da tese do caso que vem sendo julgado desde o dia 20 de novembro — esta foi a sexta sessão dedicada ao tema.

A Corte retomou o julgamento do RE 1055941, sobre a possibilidade de a Receita Federal compartilhar dados com o Ministério Público para fins penais sem autorização judicial, exclusivamente para a fixação da tese, que havia ficado pendente na última semana. Com o fim da discussão, cujo tema de repercussão geral era o 990, foi definida uma regra geral para todas as instâncias.

No texto proposto pelo ministro Alexandre de Moraes e acolhido pela maioria, o colegiado incluiu detalhe que pode beneficiar o senador Flávio Bolsonaro (PSL): o MP teria pedido informações ao ex-Coaf por email, conforme apontou a defesa dele. O ministro Marco Aurélio ficou vencido por entender que o sigilo é garantia constitucional e, por isso, toda informação enviada exigiria aval da Justiça. No entanto, não houve discussão a respeito do caso de Flávio Bolsonaro se enquadrar nos requisitos firmados, o que terá de ser avaliado em separado.

O escopo do RE foi ampliado para incluir o antigo Coaf quando Toffoli deu a cautelar a pedido do filho do presidente da República para paralisar as apurações que tinham ele como alvo no MP do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ). A questão gerou debate entre os ministros, tendo alguns deles questionado a inclusão do órgão feita por Toffoli.

O ministro Gilmar Mendes deu uma segunda decisão favorável a Flávio Bolsonaro, desta vez numa reclamação apresentada pela defesa, sob o argumento de que o MPRJ não estava cumprindo a determinação de Toffoli. As duas decisões, de Toffoli e de Gilmar, deixaram de produzir efeitos depois da conclusão de julgamento na sessão da última quinta-feira (28/11). Com isso, as investigações puderam, então, ter continuidade.

O processo de Flávio Bolsonaro corre sob sigilo, mas, na decisão, Mendes destacou que “a presença, nos autos, de e-mail enviado pelo MPRJ, datado de 14.12.2018, em que o MPRJ solicitou ao COAF, a partir do compartilhamento inicial do RIF 27.746, a ampliação das informações prestadas, o que foi prontamente realizado pelo COAF e deu origem ao RIF 38.484, também compartilhado com o MPRJ em 18.12.2018, sem prévia autorização judicial”.

A tese foi fixada nos seguintes termos:

1) É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil que define o lançamento do tributo com os órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional.

2) O compartilhamento referido no item anterior pela UIF e pela Receita Federal do Brasil deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios.

A proposta de Moraes foi debatida antes da sessão plenária, nos bastidores, conforme o próprio ministro contou. Ele foi parabenizado pelo esforço de encontrar um consenso para o caso. O ministro Ricardo Lewandowski, que no voto do RE sequer mencionou a UIF e criticou o alargamento do objeto do caso, afirmou ter conversado com Alexandre de Moraes ainda nesta quarta sobre o tema.

“Tive interlocução hoje com Alexandre de Moraes, de maneira que estou de acordo com a tese. No entanto, cheguei a aventar um detalhe que gostaria de tornar público agora. Penso que grande problema reside exatamente na requisição de dados e informações complementares por parte dos órgãos de persecução penal depois do recebimento do relatório”, disse.

Há um primeiro momento que a UIF envia o relatório, explicou Lewandowski. Ele, inclusive, citou a decisão de Gilmar Mendes sobre Flávio Bolsonaro e o fato de ter havido conversas por email: “A meu ver, isso pode importar evidente quebra de sigilo sem o crivo judicial. Gostaria de sugerir, no item 1, incluirmos a expressão ‘inclusive quanto à requisição de dados complementares’ porque no segundo, terceiro, quarto momento se faz necessário a autorização judicial”.

A sugestão não prosperou. O ministro Luiz Edson Fachin afirmou que “tudo que é fornecido está submetido a controle jurisdicional”, e o ministro Luís Roberto Barroso disse que não se estava a fazer uma regulamentação geral, mas fixando uma tese. Ele também enfatizou que “não gostaria que fosse um precedente, mas uma exceção absoluta”, sobre a inclusão de tema não presente no caso específico anteriormente.

Moraes afirmou ser desnecessária a inclusão porque estaria claro que é possível o compartilhamento dos relatórios de inteligência, que podem ser remetidos de ofício ou pedidos pela polícia e pelo MP. “São dados pré-existentes. Só pode remeter o que legalmente pode ter”, rebateu.

Fonte: JOTA (Ana Pompeu)

(04/12/2019)